terça-feira, março 29, 2011

Raciocínio

Não é pela complicação que o faço, sem desmentir já o ter pensado em tempos distantes. E quase como um desabafo oco, num grito surdo que todos ousam ouvir. Assim, deixo-me escorregar pelo têxtil que cobre o sofá e permaneço a observar os seus subtis reflexos. Acredito que funciona num anexo ao meu ser. Talvez seja o descanso que congestiona o seu funcionamento. Relembro sons que pensava um dia ouvir. E os poucos pensamentos que não ecoavam dentro dos ossos agora deixam-se ficar pela medula. Nunca me cheguei imaginar até aqui, está calor e sinto-me febril, mas também não foi graças ao juízo que cá apareci. O nervosismo já manchou a tijoleira e deixa-me lembrar a razão que tento encobrir. Não sei bem como isto se desenrola assim, mas sei que não parte apenas de um único movimento, dum conjunto deles, de palavras e onomatopeias que retenho, e, principalmente, daquilo que imagino, seja em continuidade a momentos vividos ou simplesmente novas existências por parte de pessoas a quem já cedi a fuga. Andam por aí, o mesmo local onde me encontro agora. Onde me sento a observar as folhas caramelizadas que se enrolam num rodopio em volta do meu torso. O esforço é mais do que suficiente, mas peco pelas bolhas que me cobrem os pés. Nem sei se escrever me vale de algo, embora me pareça apropriado a quem não sabe onde assentar.

quinta-feira, março 17, 2011

Vertigem

Sinto uma necessidade contínua de estragar o que me favorece, de uma forma inconsciente e quase ingénua. Quase. O abraço que por vezes ofereço às minhas estirpes não me desacomoda tanto como o osso que desloco ao exercitar, uma e outra vez, aquilo que já desisti de fazer. Assim como já desembaracei os pensamentos de algo mais meloso, digo, pastoso, que penoso. Esse peso incide sobre a minha percepção ao meu exterior, juntamente com o sôfrego e a constante necessidade de dor. Enquanto flutuo sobre estes profundos golpes que reflicto noutros não ameaço a minha resistência, quiçá o contrário. Continuo a ignorar o entendimento de que não o devo fazer, enquanto os pêlos, espigados e baços, e pedaços da podre madeira, que deixo cair, provam o contrário. O optimismo não me ocupa saber e sinto-o a escorrer-me pelos poros enquanto levito sobre a lama. E, atordoada, penso na raiva que tenho a quem o possuí, não só pela mentira que abarcam mas pela robustez que demonstram. O pouco de mim que permanece frívolo e intacto prepara-se para o fim. Quando na verdade eu só queria poder ver outros lados da mesma moeda, só me sobra o pesar da realidade mais pura, deturpada pelo estigmatismo que me acompanha.

segunda-feira, março 07, 2011

Clímax

Sinto-me a desfalecer, quase nas nuvens. O pesar dos poucos segundos sem pressa de recuperar o fôlego faz de mim um mero improviso espalhado pelo ar até ao embate no penúltimo degrau do terceiro vão de escadas. O ar quente subiu-me à tiróide num estrondo tal que deixei de matutar. Tudo porque me deixei regressar e enegrecer o teu presente à mesa-de-cabeceira, já sem pernas. Sinto o sangue quente de quem me agarra os braços e torneia as mãos enquanto a corrente de ar me massaja suavemente as pálpebras. Os aros que me envolvem os dedos descolavam da penugem que te cobre a cara enquanto libertavam pedaços de cútis, numa lentidão e fogosidade quase surreais. As poucas diferenças que nos tocavam espalharam-se pelo espartilho que vestes. Sinto que são poucas as memórias que restam do fim.

Não é tanto o arrependimento como a vergonha – na verdade gostaste quando a união nos estilhaçou, conjuntamente, o maxilar e a mão -, mas sim a sinceridade de admitir que não fora somente a embriaguez - ahn?. Foi também a vontade de reciprocar o quanto te honro.

Agora fico eu à espera da culpa e o teu cadáver à procura de cova onde desaparecer.